✝️ Por Andreyver Lima
A morte do Papa Francisco marca mais que o fim de um pontificado. É o encerramento simbólico de um ciclo geopolítico onde o Vaticano ousou deslocar o centro da fé católica de Roma para os dramas do Sul Global. Jorge Mario Bergoglio, argentino, jesuíta, latino-americano, escolheu o nome Francisco — o santo dos pobres — e com ele, plantou uma semente incômoda no seio de uma Igreja acostumada ao poder europeu.
No entanto, a última imagem oficial do Papa foi reveladora: um encontro com o vice-presidente dos Estados Unidos, JD Vance. Para muitos, apenas uma saudação pascal cordial. Para quem observa a política internacional com mais atenção, um gesto repleto de tensão silenciosa. Vance representa a nova direita americana — nacionalista, cristã, crítica do globalismo e abertamente contrária ao que chama de “agenda woke”. Francisco, por outro lado, foi o papa que defendeu migrantes, refugiados, a Amazônia e os pobres — sem meias palavras.
🌎 Um Papa “Woke”?
Nos Estados Unidos, o termo woke tornou-se um rótulo para tudo que desafia as tradições conservadoras: inclusão, justiça social, diversidade. E sob esse prisma, Francisco foi, sim, o Papa mais “woke” da história. Falou sobre a urgência climática, criticou o capitalismo desregulado, abraçou os excluídos, e não se esquivou de temas espinhosos como o acolhimento de pessoas LGBTQIA+ e o papel da mulher na Igreja.
Essa postura lhe rendeu inimigos dentro e fora do Vaticano. Nos corredores frios da Cúria Romana, bispos conservadores torciam o nariz a cada gesto de abertura. Nos gabinetes de Washington, o Papa era visto com desconfiança por setores alinhados à alt-right cristã, que sonham com um retorno a uma Igreja mais “musculosa” e menos misericordiosa.
🕊️ O Conclave é político
Mas quem escolherá o próximo Papa? Eis o ponto central desta análise.
Durante seus mais de dez anos de pontificado, Francisco nomeou mais de 70% dos cardeais eleitores. E não foram apenas nomes: foram sinais. Cardeais da África, Ásia, América Latina, do interior da Amazônia, de ilhas esquecidas do Pacífico. Um conclave que reflete o mundo real — não apenas a velha Europa.
Isso não significa, porém, que a sucessão será previsível. O colégio de cardeais é diverso, mas a tensão entre continuidade e ruptura está latente. Com a morte de um Papa considerado progressista, setores conservadores se movimentam para “reconduzir a Igreja ao eixo”. E isso em meio a um cenário mundial marcado por reações antiglobalistas, avanço da direita religiosa e polarização extrema.
🧭 O que está em jogo?
A escolha do novo Papa, neste contexto, será observada como nunca antes. Porque a Igreja Católica ainda é um dos poucos atores transnacionais com poder de mobilizar corações e mentes de bilhões. Se o sucessor de Francisco for alguém alinhado ao seu legado, a Igreja pode se consolidar como uma voz moral do Sul Global. Se houver um giro conservador, será uma vitória da “guerra cultural” que se trava nas urnas, nas redes e, agora, no trono de Pedro.
⚠️ Uma sucessão que interessa a todos
Engana-se quem pensa que o conclave é apenas um evento eclesiástico. É um ato político, diplomático e civilizacional. O sucessor de Francisco não será apenas um líder religioso, mas um ponto de equilíbrio — ou de desequilíbrio — no mundo multipolar que tentamos decifrar.
A pergunta que fica: o próximo papa dará continuidade ao legado de Francisco, com uma Igreja aberta e comprometida com as causas sociais, ou será uma figura mais reacionária, como Pio IX, voltada à defesa de uma Igreja rígida, dogmática e distante das transformações do mundo? A resposta, em breve, virá da fumaça branca na Capela Sistina.